Marcos Coimbra
O terceiro turno da eleição municipal começou antes mesmo de o
segundo terminar. Enquanto os eleitores ainda votavam, a disputa pelo troféu do
"grande vencedor" já estava em curso. Políticos, lideranças
partidárias, observadores e comentaristas entraram em campo, desde a manhã de
domingo, apresentando sua interpretação do "sentido da eleição" e decretando
quais eram, a seu ver, os ganhadores e os perdedores.
Em política, como em várias coisas na vida, às vezes importa
mais a versão do que o fato. Adequadamente embalada, a narrativa sobre o
ocorrido pode até prevalecer sobre o que efetivamente se passou. É possível ganhar
e ser derrotado, assim como perder e posar como vencedor. Depende, no fundo, de
quão alto se bate o bumbo na propagação da versão que sobrepuja as outras.
Não que seja decisivo esse terceiro turno. No fim da eleição
municipal de 2008, por exemplo, a mídia se encheu de análises que afirmavam que
o PMDB havia se tornado a "noiva cobiçada" na disputa presidencial
seguinte.
Falso. O partido já era, desde a eleição legislativa de 2006,
desejado como parceiro por petistas e tucanos, fundamentalmente por ter eleito
a maior bancada na Câmara e ter vasto tempo de televisão. Não era por ter
muitos prefeitos em cidades pequenas e algumas capitais que queriam se casar
com ele. Todos sabem que isso conta pouco na hora de ganhar a eleição para o
Planalto. Pela simples razão que a maioria dos eleitores não acha relevante
ouvir o prefeito quando escolhe o candidato a presidente.
Para as oposições e os setores da sociedade — e da imprensa —
mais hostis ao que chamam de lulopetismo, o terceiro turno da eleição recém
-concluída está sendo complicado. De um lado, precisam reduzir o significado do
desempenho objetivo de Lula e do PT, especialmente em função do resultado em
São Paulo. De outro, têm que produzir "vencedores", nem que seja às
custas de alguma prestidigitação.
O fato é que as eleições foram ruins para as oposições. Em
especial, para o PSDB. De 2004 para cá, o total de prefeitos que elegeu, com o
DEM e o PPS, caiu quase à metade. O número de vereadores diminuiu — apesar do
aumento de vagas. Suas bases municipais, tão necessárias para a eleição
legislativa, estão se esgarçando ano após ano.
O PSBD não fez, em 2012, o prefeito de nenhuma das 7 capitais
das regiões Sul e Sudeste — sequer apresentou candidato em 3 e foi derrotado em
4. No segundo turno, ganhou apenas 5 prefeituras nas 34 cidades dessas regiões
que o realizaram.
Saiu-se bem na Região Norte e em algumas capitais menores do
Nordeste. Em São Paulo, foi derrotado na capital e viu o PT vencer em 7 das 10
maiores cidades do estado. Na tentativa de desqualificar a vitória de Fernando
Haddad, começou a circular, desde a semana passada, a tese de que é de Serra a
responsabilidade exclusiva pela debacle. Que, em outras palavras, o único
derrotado foi ele. Dizer, no entanto, que "a culpa é do Serra!" —
como até Kassab se apressa em declarar — expressa apenas parte da verdade.
O que foi julgado e reprovado o ultrapassa: um discurso, uma
proposta de governo, uma "turma". O eleitorado da cidade rejeitou
mais que um indivíduo. Os problemas do PSDB preocupam a democracia. Quando a
oposição legítima se enfraquece, abre-se o caminho para toda sorte de fantasia
extrapolítica. É nesse vazio que viceja o golpismo.
Quem perde a esperança de vencer na urna faz de tudo para levar
o jogo para o tapetão.