Recomendo a importante entrevista do publicitário João Santana
publicada na Folha de S.Paulo de hoje. Entre outros assuntos, ele trata do
julgamento da AP 470, que a imprensa chama de julgamento do mensalão. Santana
diz que houve superexposição do Supremo Tribunal Federal e alerta que o excesso
midiático é um “veneno” e “intoxica”.
O especialista em comunicação, que fez as últimas campanhas
eleitorais de Dilma Rousseff e Fernando Haddad, avalia que o julgamento, com
transmissão ao vivo pela TV, “é o maior reality show da história jurídica não
do Brasil, mas talvez do planeta".
"O excesso midiático intoxica. É um veneno. Se os ministros
não se precaverem, eles podem ser vítimas no futuro", acrescenta. “O ego
humano é um monstro perigoso, incontrolável. Toda vez que você é levado a uma
superexposição sua tendência é sempre sobreatuar. Essa é a questão central.”
Para Santana, “a transmissão ao vivo potencializou os efeitos da
pressão feita pela mídia antes do julgamento”.
“Mesmo sendo transparente, uma Corte deve ter um certo recato.
Você já imaginou se todos os governos transmitissem ao vivo as suas reuniões
ministeriais? Se houvesse uma câmera ao vivo transmitindo de dentro dos
gabinetes do presidente e dos ministros? Você acha que essa transparência seria
benéfica ou maléfica? O governo seria mais democrático por se expor dessa
forma? Ou um governo mais fragilizado?”
O publicitário ainda avalia que o julgamento teve apenas
“efeito circunstancial" nas urnas neste ano.
Também vale a leitura de um artigo muito relevante de Marcos
Coimbra na CartaCapital desta semana. Ele aponta "furos e
inconsistências" nas decisões do julgamento. Entre ele, aponta as
acusações de desvio de dinheiro público e de compra de votos.
Coimbra diz que, em qualquer lugar do mundo, a ideia de “desvio”
implica a caracterização inequívoca da origem pública e da destinação privada
do dinheiro. “A história do ‘mensalão’ não faz sentido desde o primeiro
postulado. Só com imensa forçação de barra se podem considerar públicos os
recursos originados da conta de propaganda do Visanet, como demonstra qualquer
auditoria minimamente correta”.
Ele acrescenta que “a tese da compra de apoio parlamentar é tão
frágil quanto a anterior. O que anos de investigações revelaram foi que a quase
totalidade dos recursos movimentados no ‘mensalão’ se destinou a ressarcir
despesas partidárias, eleitorais ou administrativas, do PT”.