terça-feira, 13 de
novembro de 2012
Guardados para momentos graves, os editoriais de primeira página
são raríssimos na Folha, de Otávio Frias. Hoje, o jornal clama para que as
relações de Marcos Valério com tucanos de Minas Gerais sejam examinadas sem
demora. Será que isso é possível? Wafrido dos Mares Guia será beneficiado pela
prescrição. A denúncia contra Eduardo Azeredo dormita nas gavetas do STF e o
ex-procurador-geral Antonio Fernando de Souza ignorou os nomes de 79 políticos
que receberam do valerioduto tucano
247 - Assim como o jornal O Globo, a Folha de S. Paulo
também passou a definir a Ação Penal 470 como um "Julgamento para a
história". Com este título, o jornal de Otávio Frias Filho aponta num
editorial de primeira página o surgimento de um novo país, mas diz que só
haverá razões para celebrar se, no futuro, o rigor utilizado contra o PT vier a
se tornar a regra – e não a exceção.
"Outros casos, a começar pelo das
relações de Marcos Valério com o PSDB de Minas Gerais, terão de ser examinados
sem demora."
Ou seja: segundo o texto, pau que bate em Chico também deve
bater em Francisco. Mas será que isso ainda é possível? O chamado
"mensalão petista" ocorreu de 2003 a 2005 e as condenações estão
colocadas. O "mensalão tucano" ocorreu em 1998 e ainda não foi nem
sequer relatado – a esse respeito, o ministro Joaquim Barbosa já havia apontado
o desinteresse dos meios de comunicação.
Mais grave ainda, o caso de Minas Gerais já beneficiou com a
prescrição o então coordenador de campanha de Eduardo Azeredo, Wafrido dos
Mares Guia, com a prescrição, em razão dos seus 70 anos, prestes a ser
completados. Além disso, o inquérito, diferentemente do que atingiu o PT, foi
desmembrado. Azeredo é réu no Supremo, mas outros réus caíram em primeira
instância. E o mais grave de tudo é que o autor da denúncia, Antonio Fernando
de Souza, ex-procurador-geral da República, ignorou os nomes de 79 políticos
que receberam recursos do valerioduto tucano em 1998. A denúncia foi feita pelo
próprio advogado Marcelo Leonardo, que representa Valério e disse ter
apresentados até recibos de depósitos bancários. Segundo Leonardo, o
ex-procurador considerou que, no caso do PSDB, houve "caixa dois
eleitoral", um crime já prescrito – a não mensalão.
Abaixo, o editorial da Folha:
Julgamento para a história
Fixadas pelo Supremo Tribunal Federal as penas que recaem sobre
os principais acusados do mensalão, o julgamento de um dos maiores escândalos
da história republicana vai chegando ao seu desfecho.
A compra de votos de parlamentares, com recursos desviados do
patrimônio público, foi capitaneada pelo principal auxiliar do presidente Lula,
o então ministro José Dirceu. Na sessão de ontem do STF, sua punição por
formação de quadrilha e corrupção ativa, ainda sujeita a ajustes, foi
estipulada em dez anos e dez meses de prisão, a ser cumprida inicialmente em
regime fechado.
Não é o caso de celebrar, com espírito vindicativo, a decisão do
tribunal. Haverá motivos para comemorar o resultado do julgamento apenas se, no
futuro, o rigor e o cuidado que o presidiram se tornarem corriqueiros, e não,
como ainda acontece, fatos excepcionais na política do país.
Um país em que a indignação dava lugar para o conformismo e em
que todo escândalo estava destinado à impunidade e ao esquecimento -talvez esse
país comece a ser outro, a partir de agora.
Até pelo ineditismo das circunstâncias, não se pode deixar de
observar que o julgamento se deu com alguma dose de improviso.
Não havia
clareza quanto ao que fazer, por exemplo, no caso de empate entre os
magistrados. Foi a meio caminho que se fixaram, ademais, critérios
quantitativos para aumentar a pena dos condenados quando o mesmo delito se
repetia várias vezes.
As discussões entre os ministros, que frequentemente extravasaram
os contornos da serenidade que se espera de um tribunal superior, foram
entretanto evidentes demonstrações de que a decisão se deu num clima de
liberdade absoluta, com amplo espaço para a divergência.
Um julgamento minucioso, que resulta em condenações fundamentadas
solidamente em nexos fatuais e lógicos, expôs-se dia a dia pelas câmeras de TV.
Culminou-se o trabalho do Ministério Público, da Polícia Federal
e das CPIs que, deflagrado por revelações da imprensa crítica, desvendou uma
das mais complexas e nefastas tramas criminais já urdidas nos bastidores do
poder. Outros casos, a começar pelo das relações de Marcos Valério com o PSDB
de Minas Gerais, terão de ser examinados sem demora.
Não será num dia que se banirá a impunidade da política
brasileira, mas emergiram, como nunca, as condições para que isso aconteça.
Brasil 247