Nabor Bulhões alega que medida da Justiça foi "abusiva"
O bicheiro Carlinhos Cachoeira, preso na última sexta-feira em
Goiânia (GO), foi transferido para o Núcleo de Custódia do Complexo Prisional
de Aparecida de Goiânia, a 20 km da capital, neste sábado, segundo informou o
seu advogado, Nabor Bulhões. O mandado de prisão foi expedido pelo juiz
Alderico Rocha Santos, da 11ª Vara Federal, que condenou o contraventor a 39
anos, 8 meses e 10 dias de prisão por diversos crimes relativos à Operação
Monte Carlo. A prisão é preventiva e a defesa pode recorrer da sentença.
Bulhões criticou o juiz, alegando que a medida foi "abusiva".
"É um decreto nulo, ilegal, abusivo, que afronta a recente
decisão da Justiça, que concedeu um habeas-corpus. Estarei adotando as medidas
que o caso demanda nos próximos dias. Se houver abuso, irei tomar as medidas
contra isso", disse o advogado. O contraventor foi preso pela Polícia
Federal depois das 14h de ontem. Segundo o superintendente regional em
exercício da PF, Valdemar Tiago, no momento da detenção, na casa no condomínio
Alphaville, Cachoeira reagiu de forma tranquila.
O juiz Alderico Rocha Santos condenou Cachoeira a 5 anos e 10
meses de reclusão pelo crime de formação de quadrilha; 20 anos e 8 meses pelo
crime de corrupção ativa; 7 anos e 9 meses pelo crime de sigilo funcional; 9
anos e 10 meses por advocacia administrativa; e 4 anos e 8 meses pelo crime de
peculato-furto.
Prisão preventiva Para fundamentar a prisão preventiva, o juiz
afirmou que Cachoeira corrompeu policiais, "estruturou uma organização
altamente complexa, prodigiosa e hierarquizada" e que é preciso manter a
ordem pública. Ele lembrou que há uma condenação contra o réu na 29ª Vara
Criminal do Rio de Janeiro, na qual foi sentenciado a oito anos de reclusão.
"Entende-se pela (...) necessidade de se manter a ordem na
sociedade, que, como regra, é abalada pela prática de um delito. Se este for
grave, de particular repercussão, com reflexos negativos e traumáticos na vida
de muitos, propiciando àqueles que tomam conhecimento de sua realização um
forte sentimento de impunidade e de insegurança, cabe ao Judiciário determinar
o recolhimento do agente", escreveu o juiz na sentença.
Para o magistrado, Carlinhos Cachoeira expressa em toda
sociedade brasileira "que o sentimento do crime compensa, na medida em que
(...) continua em liberdade usufruindo da riqueza que o crime lhe proporcionou,
já que, até o presente momento, não se conseguiu rastrear o destino dos milhões
de reais que transitaram pelas empresas fantasmas".
Na decisão, o juiz diz que o risco não é abstrato, mas
"ponderável e concreto". "Carlos Augusto colocou a seu serviço
na prática dos crimes justamente órgãos estatais responsáveis pela repressão
criminal (corrompeu o corregedor e vários delegados da Polícia Civil, vários
comandantes da Polícia Militar de Goiás, além de delegados federais)."
Alderico Rocha Santos fixou um limite de dois anos para a prisão
preventiva de Cachoeira, estabelecendo uma fiança de R$ 10 milhões no final do
prazo.
Soltura
O bicheiro foi preso no dia 29 de fevereiro como resultado da
Monte Carlo e só foi solto no dia 20 de novembro, quando caiu a prisão
preventiva em relação a outro caso que tramita no Distrito Federal, da Operação
Saint-Michel. A Operação Monte Carlo apurou esquema de corrupção e exploração
ilegal de jogos no Centro-Oeste.
Após ser solto do presídio da Papuda, em Brasília, o
contraventor seguiu para Goiânia, onde moram sua mulher e filhos. No início do
mês, Cachoeira teve a liberdade mantida pela Terceira Turma do Tribunal
Regional Federal da 1ª Região (TRF1), por dois votos a um. No dia 25 de
novembro, logo após ser solto, o bicheiro chegou a ser internado no Instituto
Neurológico de Goiânia com sintomas de depressão e estresse. Ele recebeu alta
cinco dias depois.
Carlinhos Cachoeira
Acusado de comandar a exploração do jogo ilegal em Goiás, Carlos
Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, foi preso na Operação Monte Carlo, da
Polícia Federal, em 29 de fevereiro de 2012, oito anos após a divulgação de um
vídeo em que Waldomiro Diniz, assessor do então ministro da Casa Civil, José
Dirceu, lhe pedia propina. O escândalo culminou na Comissão Parlamentar de
Inquérito (CPI) dos Bingos e na revelação do suposto esquema de pagamento de
parlamentares que ficou conhecido como mensalão.
Escutas telefônicas realizadas durante a investigação da PF
apontaram diversos contatos entre Cachoeira e o senador Demóstenes Torres (GO),
então líder do DEM no Senado. Ele reagiu dizendo que a violação do seu sigilo
telefônico não havia obedecido a critérios legais, confirmou amizade com o
bicheiro, mas negou conhecimento e envolvimento nos negócios ilegais de
Cachoeira. As denúncias levaram o PSOL a representar contra Demóstenes no
Conselho de Ética e o DEM a abrir processo para expulsar o senador. O goiano se
antecipou e pediu desfiliação da legenda.
Com o vazamento de informações do inquérito, as denúncias
começaram a atingir outros políticos, agentes públicos e empresas, o que
culminou na abertura da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) mista do
Cachoeira. O colegiado ouviu os governadores Agnelo Queiroz (PT), do Distrito
Federal, e Marconi Perillo (PSDB), de Goiás, que negaram envolvimento com o
grupo do bicheiro. O governador Sérgio Cabral (PMDB), do Rio de Janeiro,
escapou de ser convocado. Ele é amigo do empreiteiro Fernando Cavendish, dono
da Delta, apontada como parte do esquema de Cachoeira e maior recebedora de
recursos do governo federal nos últimos três anos.
Demóstenes passou por processo de cassação por quebra de decoro
parlamentar no Conselho de Ética da Casa. Em 11 de julho, o plenário do Senado
aprovou, por 56 votos a favor, 19 contra e cinco abstenções, a perda de mandato
do goiano. Ele foi o segundo senador cassado pelo voto dos colegas na história
do Senado.
Em 21 de novembro, após 265 dias preso, Carlinhos Cachoeira,
deixou a penitenciária da Papuda, em Brasília. No mesmo dia, o contraventor foi
condenado pela 5ª Vara Criminal do Distrito Federal a uma pena de 5 anos de
prisão por tráfico de influência e formação de quadrilha. Como a sentença é
inferior a 8 anos, a juíza Ana Claudia Barreto decidiu soltar Cachoeira, que
cumprirá a pena em regime semiaberto.