Em artigo na Folha, Josias de Souza lembra intenção do ministro
de trocar a toga pelo pijama; com sua saída, a decisão da cassação de mandatos
concluída nesta segunda se torna mais frágil.
247 – O ministro Celso de Mello, que desempatou nesta
segunda-feira a votação sobre a cassação de mandatos pelo Supremo Tribunal Federal,
volta a mencionar que deseja se aposentar antecipadamente do Judiciário. Sua
eventual saída, como lembra artigo de Josias de Souza, da Folha de S.Paulo,
"pode fragilizar a decisão" sobre o tema. Como a posição final da
corte foi de maioria de 5 votos a 4, cabe recurso da defesa. Com a saída de
Mello, o placar seria invertido, já que o mais novo membro do Supremo, Teori
Zavascki, não votou nesse caso, mas já demonstrou defender que a prerrogativa
da cassação cabe ao Congresso.
Leia abaixo a íntegra de seu artigo:
Celso de Mello cogita aposentar-se e sua saída pode levar STF a
rever cassação de deputados
O ministro Celso de Mello voltou a mencionar, em privado, o
desejo de antecipar sua aposentadoria para o início de 2013. Indicado para o
STF no governo Sarney, ele integra o tribunal desde 17 de agosto de 1989. Com
66 anos, poderia permanecer na Corte até os 70. Alega, porém, que precisa
livrar-se da sobrecarga de trabalho em benefício da saúde. Pelo menos dois
colegas tentam dissuadi-lo.
A eventual saída de Celso de Mello pode fragilizar a decisão
tomada nesta segunda-feira (18), na última sessão do julgamento do mensalão.
Por uma magra maioria de 5 votos contra 4, o STF decidiu que os três deputados
que integram o rol de condenados perderão o mandato logo que o processo
transitar em julgado –ou seja, quando se esgotarem as possibilidades de
recorrer contra a sentença.
Em nota divulgada na noite passada, João Paulo Cunha (PT-SP), um
dos deputados cujo mandato está por um fio, apressou-se em informar: "Como
a decisão ocorreu por maioria mínima e estreita, cabe a apresentação de recurso
ao próprio STF, o que minha defesa irá fazer na hora adequada."
Os advogados só poderão recorrer após a publicação do acórdão,
como é chamado no jargão técnico o resumo da decisão do STF. Esse documento
deve ser impresso nos próximos 60 dias. Mantida a intenção de Celso de Mello de
trocar a toga pelo pijama, inverte-se no julgamento do recurso o placar anotado
no plenário STF nesta segunda.
Dos cinco ministros que atribuíram ao Supremo a última palavra
sobre os mandatos dos deputados mensaleiros –João Paulo, Valdemar Costa Neto (PR-SP),
Pedro Henry (PP-MT) e, eventualmente, o suplente José Genoino (PT-SP)—
restariam apenas quatro: o relator Joaquim Barbosa e os colegas Luiz Fux,
Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello.
Do outro lado, os quatro ministros que endossaram a tese de que
cabe à Câmara deliberar sobre os mandatos –o revisor Ricardo Lewandowski, Rosa
Weber, Dias Toffoli e Cármen Lúcia— ganharão o reforço do novato Teori
Zavaschi. Recém-chegado ao Supremo, Teori já publicou até artigo em jornal
sustentado que a Constituição confere às duas Casas do Congresso poderes para
decidir sobre a cassação de deputados e senadores condenados em ações penais.
Teori não participou do julgamento do mensalão porque chegou ao
STF com a locomotiva em movimento. Tomará parte, porém, do julgamento dos
embargos, como são apelidados os recursos. Quer dizer: confirmando-se a saída
do decano Celso de Mello, o placar de 5 a 4 a favor da poda automática dos
mandatos passa a ser de 5 a 4 pela transferência da batata quente para o
plenário da Câmara, que decidirá o futuro dos condenados em votação secreta.
Uma particularidade distingue o caso de João Paulo dos demais.
Antes de aposentar-se, o ex-ministro Cezar Peluso participara da sessão em que
João Paulo fora condenado. Ele havia deixado por escrito a dosimetria da pena
do deputado. Além de enviá-lo à cadeia, suspendeu-lhe os direitos políticos e
votou pela perda do mandato.
Ou seja: no caso de João Paulo, computando-se o voto de Peluzo,
o placar seria de seis a quatro pela cassação automática. Ao proclamar o
resultado, porém, o presidente Joaquim Barbosa não fez tal distinção. Teori
entrou no STF na vaga de Peluso. Na hora de julgar o recurso de João Paulo, o
Supremo terá de decidir se vale o voto do antecessor ou o do titular.
De resto, o placar pode ser modificado dependendo do ritmo e da
qualidade das indicações que Dilma Rousseff terá de fazer para o STF. Já se
encontra pendente de preenchimento a vaga de Carlos Ayres Britto, que se
aposentou pouco depois de Peluso, antes da conclusão da fase da dosimetria.
Saindo Celso de Mello, seriam duas as cadeiras vazias.
A menos que Dilma escolha uma dupla de magistrados fechados com
a tese da lâmina, são grandes as chances de o atual presidente da Câmara, Marco
Maia (PT-RS), sorrir por último. Nesta segunda-feira, mesmo depois de ter sido
chamado de "irresponsável" por Celso de Mello, Maia reiterou:
"Houve uma ingerência sobre um Poder que tem garantido pela Constituição o
direito de cassações de mandatos dos seus parlamentares."
Além de Celso de Mello há apenas outros dois ministros que
chegaram ao STF antes da Era petista: Marco Aurélio Mello, indicado por
Fernando Collor; e Gilmar Mendes, guindado ao Supremo por Fernando Henrique
Cardoso. Todos os demais saíram das canetas de Lula e Dilma.
A dança de cadeiras tende a influenciar no julgamento de outros
recursos. Se Celso de Mello bater mesmo em retirada, hipótese que admitira há
quatro meses numa entrevista à repórter Mônica Bergamo, será a segunda baixa na
infantaria do 'mata-e-esfola'. A exemplo do recém-aposentado Ayres Britto, o
decano também seguiu os votos draconianos do relator Barbosa em 99,9% dos
casos.
Um dos advogados de grife que atuam no processo recordava na
noite passada que todos os réus que tiveram no mínimo quatro votos a favor da
absolvição recorrerão das sentenças condenatórias. Num julgamento permeado de
placares espremidos, a ausência de um par de magistrados duros pode significar
a migração de uma cana dura para um regime semi-aberto.