Presidenciável cobra união entre partidos de esquerda, centro e direita e faz sinal a PT, que não participou do ato deste domingo, convocado pelo MBL
SÃO PAULO — Líderes políticos que discursaram em ato contra o presidente Jair Bolsonaro na Avenida Paulista, região central de São Paulo, na tarde deste domingo, pregaram a união de todos os campos políticos para pedir o impeachment do chefe do Executivo. O ex-ministro Ciro Gomes (PDT) defendeu uma aliança de "quem for democrata" e, em um aceno ao PT, que não aderiu aos atos deste dia 12, disse que "ainda há tempo" para a sigla integrar o movimento.
— Para fazer o impeachment e proteger a democracia brasileira temos que juntar todo mundo. Ainda há tempo para o PT amadurecer. Quem for democrata tem que entender que o impeachment é a a única saída. Precisamos fazer um acordo com a direita e um centro democrático — disse.
Outro presidenciável no ato, o governador de São Paulo João Doria (PSDB), participou pela primeira vez de uma manifestação contra Bolsonaro e admitiu a possibilidade de fazer uma ponte com o PT.
— Temos que estar junto para formar uma grande frente democrática. Pela defesa da liberdade, dos valores, da constituição e da comida no braço e vacina no prato.
Ao fim do discurso, o governador pediu "Fora Bolsonaro" e dançou aos pulos enquanto os manifestantes respondiam com xingamentos ao presidente. Depois, ao ser questionado pela imprensa sobre a ausência da CUT e do PT no ato, o governador paulista evitou críticas:
— Vejo (a ausência) com normalidade. Temos que evoluir no processo de adensar, de somar e de agregar. E de respeitar o sentimento das pessoas. As pessoas, os partidos e movimentos políticos não são iguais. Mas temos algo que nos une que é a defesa do Brasil.
Além de Doria e Ciro, também compareceram ao ato o ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta (DEM), os senadores Simone Tebet (MDB-MS) e Alessandro Vieira (Cidadania (ES), os deputados federais Tabata Amaral (sem partido-SP), Joice Hasselmann (PSL-SP), Orlando Silva (PCdoB-SP), Kim Kataguiri (DEM-SP) e Marcelo Ramos (PL-AM), os deputados estaduais Isa Penna (PSOL-SP) e Arthur do Val (Patriota-SP), o presidente da Força Sindical, Miguel Torres.
Candidato à Presidência da República em 2018, assim como Ciro, João Amoedo (Novo) também pregou união pelo impeachment:
— Ninguém aqui tem medo de dizer que é esquerda e direita. Isso é besteira de quem quer manter o Bolsonaro no poder. A prioridade é o impeachment — disse o empresário.
A manifestação ocupou trechos da via. A avenida não chegou a ser totalmente interditada, e a maior concentração de pessoas era num trecho de cerca de 500 metros entre os prédios da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e do Museu de Artes de São Paulo (Masp).
Com o mote "Fora, Bolsonaro", o ato na Avenida Paulista faz parte de uma campanha do Movimento Brasil Livre (MBL), Vem Pra Rua e outros grupos, que convocou manifestações em ao menos 15 capitais. No Rio, manifestantes se reuniram na praia de Copacabana na manhã deste domingo para pedir o impeachment do mandatário. Em Belo Horizonte, a concentração ocorreu na Praça da Liberdade, no centro da capital.
Líderes do MBL como Renan Santos, Kataguiri e do Val, reconheceram as divergências com a esquerda ao apresentarem Ciro e Orlando Silva. Ainda assim, pediram que seus apoiadores, na maioria jovens de direita, aplaudissem os antigos adversários políticos.
— Todos sabem das nossas divergências. Mas quero poder discordar deles democraticamente — disse Do Val.
O coro de união de vários campos políticos numa aliança contra Bolsonaro foi engrossado pela presidente da UNE, Bruna Brelaz:
— Precisamos reunir os amplos setores da sociedade para derrubar aquele que está destruindo o nosso Brasil. Faço um chamado para que a gente deixe de lado as nossas diferenças. Esquerda, centro e direita. Chega de Bolsonaro!
Na mesma linha, o cantor Tico Santa Cruz afirmou que os manifestantes devem focar na saída de Bolsonaro no poder para, depois, falar sobre eleições:
— Eleição de 2022 a gente decide em 2022, nas urnas. Nossa pauta agora é retirar o Bolsonaro. Ele disse: ou vai pra cadeia, ou ele morre ou ele ganha. Efetivamente, não quero que Bolsonaro morra, mas o Bolsonaro também não vai ganhar. Mas o Bolsonaro vai pra onde? Cadeia" — afirmou o músico.
Inicialmente, o MBL pretendia fazer um protesto com o mote "Nem Bolsonaro, nem Lula", em apoio a uma terceira via nas eleições de 2022. Ao longo da semana, porém, num sinal para receber a adesão de outras siglas de esquerda, o grupo concordou em fazer um ato apenas pedindo a saída de Bolsonaro do cargo.
Apesar disso, havia, ao lado do carro de som do Vem Pra Rua, um boneco inflável com Bolsonaro, de camisa de força, e Lula, com roupa de presidiário, abraçados. Enquanto lideranças oolíticas discursavam a favor da união do campo democrático pelo impeachment de Bolsonaro no carro de som do MBL, onde estava a maior parte do público, um dos líderes do Vem Pra Rua, Rogério Chequer, falava que não quer "o PT de volta nunca mais".
Enquanto Ciro e outros nomes do PSB e PCdoB compareceram ao ato. PT e PSOL descartaram adesão e trabalham para a realização de uma manifestação mais ampla contra Bolsonaro para outubro ou novembro.
Criado em 2015, o MBL esteve por trás de grandes manifestações de rua em São Paulo que pediam o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Boa parte do público daqueles atos, no entanto, mantém apoio a Bolsonaro e foi à Avenida Paulista, quando o presidente fez ameaças aos outros Poderes e afirmou que não cumpriria mais decisões do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes. Ele, depois, diria que o discurso foi feito "no calor do momento".
Orlando Silva disse, no carro de som, que entende que o PT não participou para evitar um desconforto com o MBL. Segundo ele, porém, é importante criar um campo para que o maior partido da oposição possa aderir aos atos. Ele lembrou da organização das Diretas-Já:
— Pensam que foi tudo flores, mas houve muita contradição.
Próximo a um dos carros de som do MBL, boa parte das pessoas usava camisa branca, como recomendara a organização do ato. Mas ao longo da avenida, há todo tipo de vestimentas: pessoas com cores que remetem à temática LGBT e com camisetas amarelas, portando bandeiras do Brasil. Um ambulante vendia, em uma das esquisas, bandeiras com as figuras do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da vereadora Marielle Franco, assassinada em 2018, além de estampas com a frase "Fora, Bolsonaro".
Apoiadores de Bolsonaro chegaram a passar pela Avenida Paulista e filmaram o ato com seus telefones, em tom de deboche.