1 - Apresentação:
No dia 1 de fevereiro de 2021, o deputado Arthur Lira (PP-AL) foi eleito presidente da Câmara dos Deputados com o apoio público e incondicional do "presidente" Jair Bolsonaro, esperançoso de uma relação menos conflituosa com o parlamento. A aproximação efetiva de Bolsonaro ao Centrão (do qual o PP faz parte), desde meados de 2020, foi fator fundamental para a vitória de Lira contra o deputado Baleia Rossi (MDB), candidato do ex-presidente da Casa, Rodrigo Maia (sem partido).
Do ponto de vista econômico, as agendas de ambos eram bastante próximas às preferências do governo. Politicamente, contudo, Lira prometia maior alinhamento em pautas de interesse do presidente em troca de mais controle na distribuição de recursos e cargos, ainda que mantivesse o tom, enfatizado por Maia ao longo do seu mandato, de independência política do Legislativo frente ao Executivo.
A consagração da vitória de Arthur Lira (PP) à presidência da Casa, portanto, criou expectativas com relação à natureza da agenda legislativa do ano. Em linhas gerais, esperava-se maior avanço das reformas estruturais mirando o enxugamento da máquina pública – tão ao gosto da agenda liberal que une as forças à direita do espectro político e supostamente importantes para a agenda eleitoral do "presidente" Bolsonaro em 2022 –, avanço moderado de pautas políticas conservadoras e maior ímpeto legislativo para aumento da participação dos deputados na alocação de recursos orçamentários (tendo em vista o perfil dos partidos que compõem o Centrão). Isso mesmo diante do prolongamento do uso do Sistema de Deliberação Remota (SDR) da Câmara, instituído em decorrência da Covid-19, que impôs restrições institucionais formais à agenda do parlamento durante a pandemia, a exemplo da exigência de votação de projetos preferencialmente relacionados à crise sanitária. Em outras palavras, a despeito do SDR, a expectativa geral de alguns estudiosos e da mídia era a de uma produção da Câmara mais alinhada às preferências governamentais.
Depois de quase um ano de gestão, descobrimos que o prognóstico desenhado estava apenas parcialmente correto. A reforma administrativa foi praticamente engavetada, a tributária está em processo de aprovação a duras penas, com redução significativa do escopo das propostas iniciais, o Bolsa Família foi enterrado e substituído pelo programa Auxílio Brasil, cujo financiamento é ainda incerto, o voto impresso foi rejeitado e a participação do legislativo no planejamento orçamentário aumentou de forma significativa, discricionária e pouco transparente, a partir do uso deliberado das emendas de relator (o chamado “orçamento secreto”). É difícil mensurar, do ponto de vista qualitativo, se o saldo foi positivo para o Bolsonaro. Todavia, não faltaram esforços de Arthur Lira (PP) para dar prosseguimento às pautas mais caras ao governo e a seus aliados.
A gestão de Lira tem sido caracterizada por alto grau de centralização decisória, mesmo após a suspensão parcial do SDR, que resultou em maior concentração dos trabalhos legislativos nas figuras dos líderes e do presidente da Mesa, devido à suspensão do trabalho das comissões. Ao longo de sua gestão, Lira tem manejado o regimento interno de forma surpreendente, atropelando ritos, levando à votação projetos cujo teor não foi previamente compartilhado com os deputados, criando comissões especiais para encurtar o tempo de debate, substituindo comissões especiais por grupos de trabalho e amparando a aprovação de emendas de plenário em desacordo com as regras regimentais. O debate sobre a reforma eleitoral para 2022, que, ao fim e ao cabo, trará aspectos positivos para a competição em virtude da interdição da Câmara pelo Senado, é um exemplo nessa direção; a votação da PEC do Ministério Público é outro.
Além disso, Lira conduziu a Câmara à aprovação de uma nova reforma regimental ainda em maio de 2021. A Resolução 21/2021 modificou um conjunto de artigos legitimamente utilizados pela oposição para a obstrução das votações, alterando elementos centrais do debate e da deliberação (tempo das sessões, qualidade da comunicação, destaques e emendas). O resultado foi a eliminação de recursos protetivos e de barganha da minoria, com impacto negativo na amplitude da representação.
Para uma melhor avaliação quantitativa dos resultados da gestão de Lira ao longo de 2021, o Observatório do Legislativo Brasileiro (OLB) fez um balanço comparado do ano legislativo atual com o de 2020, considerando todas as proposições tramitadas no período. Visando garantir maior comparabilidade dos dados, optamos por um recorte temporal que se estende do início de fevereiro de 2020 ao final de outubro de 2021, já que, a partir de novembro deste ano, a Câmara voltou ao trabalho presencial pleno, com regras distintas daquelas previstas no SDR, em que não havia funcionamento das comissões e todo o trabalho legislativo estava sendo realizado de forma remota.
Analisamos, especificamente, o volume de matérias tramitadas, o volume e a natureza das proposições aprovadas, o tempo de tramitação das proposições e a taxa de apoio recebida pelo governo nas votações nominais na expectativa de captar diferenças específicas que marcaram as presidências de Rodrigo Maia (sem partido) e de Arthur Lira (PP).
O relatório se divide em sete sessões: panorama geral, proposições tramitadas por partido, distribuição das proposições movimentadas por tema, leis aprovadas em 2021, velocidade de tramitação, apoio ao governo e pontos de atenção.
2. Panorama: cresce o número de proposições movimentadas, com destaque para Propostas de Emenda à Constituição
No ano de 2021, 13.233 matérias tramitaram na Câmara contra 7.846 em 2020 – um crescimento de 68%. E isso mesmo levando em conta o fato de o recorte temporal definido não contabilizar os meses de novembro e dezembro de 2021. Confira matéria completa aqui no Observatório do Legislativo Brasileiro