OCDE revela 'expressa preocupação' com impunidade nos casos de corrupção no Brasil
Documento demonstra preocupação com casos anulados pela Justiça, propõe medidas para evitar politização da PGR e se contrapõe a Toffoli na decisão que anulou provas do acordo de leniência da Odebrecht
Sede da OCDE, Em Paris — 📷: Divulgação
A Organização para Cooperação do Desenvolvimento Econômico (OCDE) alertou o Brasil sobre os casos de corrupção transnacional envolvendo o país, e a falta de resolução e punição de envolvidos. Além disso, aponta preocupação sobre a influência política e a necessidade de adotar "salvaguardas para proteger" a Procuradoria-Geral da República (PGR) de politização.
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As críticas e outras sugestões constam em um relatório divulgado nesta quinta-feira pelo Grupo de Trabalho Antissuborno da organização (WGB), produzido na quarta fase da avaliação sobre o cumprimento pelo Brasil da Convenção Antissuborno. O país aderiu à convenção em 2000.
O texto demonstra "expressa preocupação" sobre a impunidade nos casos de corrupção transnacional no Brasil. De acordo com o documento, ninguém foi condenado de forma definitiva no país, e muitos casos foram anulados pela Justiça. Em quase dez anos, oito de nove réus foram absolvidos devido a prescrição dos crimes.
O documento também cita a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, determinando a anulação de todas as provas obtidas no acordo de leniência da Odebrecht, homologado em 2017. A decisão proferida por Toffoli, em setembro deste ano, pode se refletir na revisão de penas da Operação Lava-Jato e devolução de multas pagas por executivos e pela empresa.
O relatório da OCDE afirma que a decisão de ministro ocorreu após a visita dos avaliadores da organização no país, mas foi mencionada no documento e encabeça a lista de temas que serão monitorados pelo grupo, e que o Brasil deve prestar esclarecimentos em dois anos.
O documento se contrapõe à premissa de Toffoli na decisão, e afirma que a organização internacional avaliou como positivo o acordo de leniência. "Todas as autoridades competentes, incluindo a CGU, o MPF e a PF, promoveram laços e contatos informais, através do envolvimento com suas contrapartes estrangeiras, bem como da participação em iniciativas regionais ou outras redes de agentes da lei”, diz o texto, recomendando que “desenvolver e manter esses laços e essa cooperação informais é reconhecido como uma boa prática, crucial e internacionalmente aceita”.
Em nota, O STF pondera que o acordo de leniência da Odebrecht não foi anulado pela Corte e continua "válido e eficaz". "A decisão de imprestabilidade das provas produzidas no âmbito do acordo já havia sido proferida pelo antigo relator do caso e referendada pela maioria da Segunda Turma. A decisão proferida pelo Ministro Dias Toffoli aplicou referida decisão aos pedidos de extensão formalizados por outras partes que se encontravam na mesma situação do pedido original, tudo na forma de reiterada jurisprudência da Corte", diz a nota.
Politização da PGR
O texto demonstra preocupação sobre a influência política em decisões envolvendo a Justiça, cita “a percepção, baseada em diversos relatos de politização da Procuradoria-Geral da República e a interferência indevida do anterior Presidente na Polícia Federal e outras agências de investigação.”
O trecho se refere a gestão de Jair Bolsonaro e sugere que o país adote salvaguardas para proteger a PGR, e que o país reforce garantias "contra possíveis vieses políticos de agentes de aplicação da lei, bem como contra o possível uso arbitrário de medidas disciplinares ou de outras formas de responsabilização como meios de retaliação contra procuradores envolvidos em ações sensíveis anticorrupção ou correlatas.”
O documento apresentado nesta quinta-feira foi aprovado no último dia 11, em Paris. A delegação do Brasil que participou das discussões são da CGU, chefiada atualmente pelo ministro Vinicius de Carvalho.
O Brasil aderiu à Convenção Antissuborno da OCDE em 2000, e passou por avaliações sobre a implementação de mecanismos de prevenção e combate à corrupção transnacional quatro vezes. A terceira foi realizada em 2014, e a última, agora em 2023. Além disso, o país apresentou um relatório parcial com recomendações que haviam sido apresentadas na terceira rodada de avaliações. O Globo