“Ronnie Lessa está querendo proteger alguém, mas ninguém está acima da lei”, diz conselheiro do TCE apontado em suposta delação de Ronie Lessa como mandante do crime
Bolsonaro, Marielle Franco e Domingos Brazão (Foto: Adriano Machado/Reuters | Mídia Ninja | Reprodução/TV Globo)
247 - O conselheiro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro (TCE-RJ), Domingos Brazão, apontado como o mandante da morte da vereadora Marielle Franco em suposta delação de Ronnie Lessa à PF, em entrevista ao Uol, negou ter qualquer participação no crime e ratificou que, caso a delação seja verdadeira, a intenção seria proteger o verdadeiro mandante do crime. “Minha participação nesse crime é zero. Já passaram mais de cinco delegados pela delegacia de homicídios e eu não posso imaginar que todos eles estejam arriscando a sua função pública e suas carreiras para me proteger”, destacou.
Sobre a acusação feita pela ex-PGR Raquel Dodge, em 2019, de que ele teria tentado obstruir as investigações sobre o caso, Brazão disse que “essas investigações foram conduzidas pela Polícia Federal, que concluiu que eu não havia participado de nenhum tipo de obstrução. Inclusive, penalizando aqueles que o fizeram e que estão presos”. >>> Jean Wyllys lembra que Marielle foi morta sob a intervenção militar comandada pelo general Braga Netto, no Rio
Perguntado sobre o porquê de o seu nome ter sido apontado por Ronnie Lessa como mandante do assassinato de Marielle, Brazão alertou que é preciso ter responsabilidade com as informações e questionou a veracidade da delação. “Primeiro, eu não sei se isso é verdade, porque eu jamais tive acesso a esses autos. Quando peticionamos não nos deram acesso, sob a alegação de que não fazíamos parte do inquérito e, portanto, eles não eram obrigados a nos franquear acesso. Vocês estão me dando uma informação que eu não tenho. Não sei se vocês têm. Inclusive, a Polícia Federal emitiu uma nota dizendo que a tal delação não procede. Então, eu acredito que isso [a delação] não seja verdade. E, caso seja verdade, acho que a Polícia Federal estará diante de um outro crime, que é a pretensão desse marginal de querer proteger alguém ou receber alguns benefícios da justiça”, ponderou.
Irmão do deputado federal Chiquinho Brazão, que em 2022 apoiou as candidaturas de Jair Bolsonaro à presidência, e de Flávio Bolsonaro ao senado, Domingos Brazão disse conhecer a família Bolsonaro, mas negou que mantenha proximidade com ela. Ele também analisou se o caso já estaria perto do fim e comentou a postagem feita pelo ex-presidente comemorando um possível desfecho no caso Marielle após a suposta delação de Lessa, o que cessaria, segundo ele, a “narrativa descomunal e proposital criada por grande parte da imprensa e pela militância da esquerda”, que tentava ligá-lo ao crime. “Eu não tenho elementos para fazer esse julgamento. O que eu posso dizer é que seria maravilhoso se esse caso fosse concluído. Seria um conforto para a família da Marielle, para a minha família e para todos do estado do Rio de Janeiro e, principalmente, para a segurança da classe política. Porque esse é um crime que não pode passar em vão e todos os envolvidos precisam ser rigorosamente punidos. Quanto a Bolsonaro, não vou fazer juízo de valor sobre o que ele falou. Eu só não consigo imaginar a quem o Lessa possa estar querendo encobrir. E esse ‘não posso imaginar quem’ é bem amplo e eu prefiro confiar nas investigações”, destacou.
Questionado se a amplitude de sua desconfiança com o possível protegido de Ronnie Lessa na delação que o aponta como mandante do crime, poderia levá-lo a suspeitar do envolvimento da família Bolsonaro no crime, Brazão responde que “eu não acho nada. Quem tem que dar essa resposta são as autoridades que têm essa responsabilidade e essa competência. Eu só estou dizendo que é amplo, geral e irrestrito, e que todos nós temos que nos curvar às leis e obedecê-las. Como o ex-presidente gostava de falar, temos que estar dentro das quatro linhas. É isso!”.
Brazão conclui reafirmando a sua certeza de que, caso a delação de Ronnie Lessa tenha mesmo acontecido, a intenção é proteger alguém. “Com certeza. Tenho absoluta certeza disso e posso garantir a vocês. Porque eu não conhecia, não tenho envolvimento e nem faço parte daquela gente. Vou repetir para todos que nos assistem, com certeza ele quer proteger alguém que não sou eu. Não serei leviano em dizer que seja alguém da família Bolsonaro, mas repito que ninguém está acima da lei”, finalizou.
Após toda a repercussão sobre o caso, a Polícia Federal divulgou nota em que não confirma o que Ronnie Lessa teria dito. A PF afirmou que o ex-PM não teve ainda seu acordo de colaboração homologado pela Justiça.
Independente do que virá da delação de Lessa, o fato concreto é que o clã Bolsonaro tem relações antigas com a família Brazão, que, por sua vez, tem conexões com a milícia que controla parte da zona oeste do Rio. Além disso, o assassino de Marielle, que agora diz querer falar sobre o crime, foi vizinho do ex-presidente no condomínio Vivendas da Barra. Sem falar que durante seis anos, incluindo o mandato de Bolsonaro, as investigações não avançaram. Como o acordo de delação não foi homologado pela Justiça, não se pode confiar no que foi divulgado até o momento. E mesmo quando for, é necessário que Ronnie Lessa aponte provas que embasam as acusações que ele fizer sobre o mandante do crime político.
De toda a história e considerando as relações do clã Bolsonaro, se Jair está demonstrando alívio com o que Lessa teria dito, alguma coisa não está devidamente esclarecida. É preciso cautela neste momento, aguardar elementos mais concretos e não tomar como fato esta informação divulgada inicialmente pelo Intercept.