Presidente russo usará reeleição com supostos 87,2% dos votos como demonstração da unidade nacional para prolongar guerra e solidificar o poder sem opositores.
Por Sandra Cohen
O presidente da Rússia usará os números de sua vitória eleitoral como prova da unidade do país para prolongar, em seu quinto mandato, a guerra que executa há dois anos na Ucrânia e assegurar mais repressão sobre a dissidência.
O sistema eleitoral suspeito e fraudulento é aferido como incontestável para Vladimir Putin e lhe assegurou 87,2% dos votos — mais do que o Kremlin previra.
A consolidação do poder seguirá plenamente pelo menos até 2030, apesar dos protestos registrados nas grandes cidades russas durante a votação. Putin tem no bolso uma carta branca para implementar medidas impopulares no período pós-eleitoral.
Especula-se que ele ordenará uma segunda grande mobilização militar para a sua operação especial na Ucrânia, que até hoje não assumiu na Rússia a conotação semântica de uma guerra.
Embora os erros de Putin tenham imprimido severas derrotas à Rússia no país vizinho, a economia resistiu às sanções ocidentais. A indústria de armamento trabalha noite e dia e fez o PIB russo aumentar 3,6% em 2023.
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Os laços com países como China, Índia, Irã, Coreia do Norte e países do Sul Global se fortaleceram e redirecionaram as pressões exercidas pelas sanções ocidentais. Esse apoio foi sacramentado nas mensagens de felicitações que recebeu de líderes desse bloco, enquanto os do Ocidente contestavam a vitória, reafirmando a fraude e a ausência de observadores internacionais.
Putin tira proveito da reticência dos republicanos do Congresso americano em apoiar o pacote da Casa Branca destinado à Ucrânia e saboreia o esvaziamento do suporte europeu ao país. O quinto mandato será um teste de resistência para os aliados da Otan.
Enquanto os russos votavam, as tropas avançavam contra o Exército ucraniano, que amarga falta de munições e de pessoal. O fracasso da contraofensiva anunciada pelo presidente Volodymyr Zelensky impulsionou a estratégia eleitoral do Kremlin.
“A iniciativa pertence inteiramente às forças armadas russas. Em algumas áreas, nossos homens estão apenas arrasando eles, o inimigo”, celebrou o presidente no discurso de vitória.
Pela primeira vez, ele citou o opositor mais ferrenho, Alexei Navalny, que morreu em circunstâncias misteriosas numa colônia penal no Ártico, para dizer que o teria trocado por presos russos em países ocidentais se o pior não tivesse acontecido. “Sim, o senhor Navalny faleceu. Este é sempre um acontecimento triste.”
A presença de Navalny se fez lembrar em longas filas formadas ao meio-dia de domingo em sessões de votação, num protesto idealizado anteriormente pelo dissidente contra o presidente.
Putin se reelege sem opositores, sem liberdade e sem escolha, conforme ressaltou o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel. O triunfo eleitoral reforçará a retórica bélica do presidente russo e enviará a mensagem de seu contundente controle sobre a política russa.
Policiais detêm um homem durante uma reunião em memória de Alexei Navalny perto do monumento Muro da Dor às vítimas da repressão política em Moscou, — Foto: Reuters