É mais importante o combate à miséria ou à corrupção?

Do ponto de vista ético, o combate à miséria é a grande questão, responde Renato Janine Ribeiro, não sem observar que a miséria é agravada pela corrupção


O professor Renato Janine Ribeiro responde à seguinte questão: é mais importante o combate à corrupção ou à miséria? “É óbvio que devem ser combatidas as duas, tanto corrupção quanto miséria, inclusive porque a corrupção, na sua essência, é o quê? É a apropriação privada do que é público, ou seja, a forma pela qual pessoas que estão numa posição de poder, econômico ou político, desviam dinheiro que é de todos para seus próprios bolsos. Então, nesse sentido, a corrupção está ligada com a desigualdade social, a corrupção é uma forma pela qual as elites pegam o bem que é privado.” Nesse ponto, o colunista observa que, historicamente, no Brasil, o tema do combate à corrupção tem sido um tema levado pela direita, e mesmo pela extrema-direita, e geralmente para combater aqueles que tentam políticas públicas no sentido de reduzir a desigualdade social. Isso, de acordo com ele, aconteceu com Getúlio Vargas e também com João Goulart, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, cujos governos “foram acusados de corrupção, mesmo sem haver provas ou mesmo não sendo a corrupção comparável à de governos de direita”.

O que ocorre, diz Janine Ribeiro, é que existe uma tentativa de utilizar o argumento do combate à corrupção – tema ao qual o eleitorado brasileiro, assim como o dos países pobres, é muito sensível – como forma de desmoralizar quem tenta mudar a vida social. Segundo o colunista, o  problema crucial “que nós temos, o nosso grande problema antiético, pode até ser agravado pela corrupção, e de fato é, mas o nosso grande problema é a miséria, é o fato de que temos multidões que não têm igualdade de oportunidades […] se nós não tivermos um ambiente social que favoreça a educação, que dê alimentação decente, que faça com que a pessoa não perca todo o seu tempo com transporte coletivo ruim e demorado, que ela resida num lugar que lhe permita uma saúde decente, a competição não é justa”.

De resto, Janine avalia que a sociedade capitalista é uma sociedade de competição. “Por isso mesmo, o capitalismo valoriza o mérito, o êxito na competição, mas, para a competição ser justa moralmente, as pessoas têm que ter regras iguais, mas têm que partir de um ponto de partida próximo ou semelhante, e elas têm, além do mais, que jogar por regras do jogo que valem para todos, que são dois pontos que faltam muito em nossa sociedade.” E conclui: “Do ponto de vista ético, mais do que do ponto de vista partidário ou mesmo político, nós temos que considerar que o combate à miséria é a grande questão, isso passa por políticas públicas que garantam a vitória sobre a fome, que garantam uma educação boa e saúde decente para todos, sem contar moradia e transporte”.

Ética e Política

A coluna Ética e Política, com o professor Renato Janine Ribeiro, vai ao ar quinzenalmente, quarta-feira às 8h, na Rádio USP (São Paulo 93,7; Ribeirão Preto 107,9) e também no Youtube, com produção da Rádio USP,  Jornal da USP e TV USP.


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