"Lula foi aplaudido várias vezes, fez uma profunda crítica ao estado atual da governança global e pediu esforço maior contra crise climática", diz Aquiles Lins
Presidente Lula discursa na abertura da 79a Assembleia Geral da ONU (Foto: Ricardo Stuckert/PR) |
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva proferiu nesta terça-feira (24) um potente e abrangente discurso na abertura da 79ª Assembleia Geral da ONU. Lula fez uma profunda crítica ao estado atual da governança global, à ineficácia das instituições multilaterais, ao avanço de conflitos armados, ao avanço da fome no mundo e à lenta resposta à crise climática. Lula enfatizou a necessidade de uma ampla reforma na ONU para enfrentar as mudanças rápidas e desafiadoras do cenário internacional.
O presidente defendeu a necessidade de uma reforma no organismo internacional, e destacou o fato de não haver equidade de gênero no comando da ONU. "Prestes a completar 80 anos, a Carta das Nações Unidas nunca passou por uma reforma. Apenas quatro emendas foram aprovadas, todas elas entre 1965 e 1973. A versão atual da carta não trata de alguns dos desafios mais prementes da humanidade. Na fundação da ONU, éramos 51 países, hoje somos 193. Várias nações, principalmente no continente africano, estavam sob o domínio colonial e não tiveram voz sobre seus objetivos e funcionamento. Inexiste equilíbrio de gênero no exercício das mais altas funções. O cargo de secretário-geral jamais foi ocupado por uma mulher", disse Lula.
O presidente sugeriu transformar o Conselho Econômico e Social da ONU em um fórum central para abordar o desenvolvimento sustentável e combater as mudanças climáticas, com real capacidade de influenciar as instituições financeiras. Além disso, propõe revitalizar o papel da Assembleia Geral, especialmente em questões de paz e segurança internacionais, fortalecer a Comissão de Consolidação da Paz, e reformar o Conselho de Segurança, aprimorando sua composição, métodos de trabalho e o direito de veto, para torná-lo mais eficiente e alinhado às realidades do mundo atual.
Um dos principais pontos levantados por Lula é a escalada de gastos militares globais e a persistência de conflitos, como na Ucrânia e no Oriente Médio. Ele destacou a incapacidade de um consenso sobre soluções pacíficas, observando que, enquanto bilhões de dólares são gastos em armamentos, a fome e a pobreza continuam a crescer. Lula apontou, com pesar, o fracasso na construção de um Tratado sobre Pandemias, que poderia ter sido um marco de união após a COVID-19.
A crítica de Lula se estende à crise climática, reiterando o compromisso do Brasil em erradicar o desmatamento até 2030 e defendendo a inclusão dos povos indígenas nas soluções para a Amazônia. Ele reforçou o papel do Brasil como líder no setor de energia limpa e a importância de uma bioeconomia sustentável. O presidente também alertou para a iminência de 2024 ser o ano mais quente da história, o que exige medidas urgentes de descarbonização global.
Outro ponto de destaque no discurso do presidente Lula na ONU é o apelo por justiça econômica. Lula questionou o papel das grandes corporações e bilionários no aumento das desigualdades, propondo padrões mínimos de tributação global. Ele criticou a concentração de riqueza, enquanto milhões sofrem com a fome e a exclusão social, e enfatizou o compromisso do Brasil em erradicar a fome internamente e globalmente, por meio da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza.
Com um mundo à beira do colapso, permeado por guerras, e cada vez mais extremos climáticos, o discurso do presidente Lula foi uma defesa contundente do multilateralismo, com críticas firmes ao status quo, e uma visão de um mundo mais justo, sustentável e pacífico. O presidente apresentou o Brasil como um ator central na busca por soluções para os desafios globais, destacando-se tanto no combate à crise climática quanto na luta contra a fome e a desigualdade.
Aquiles Lins é colunista do 247, comentarista e diretor de projetos especiais do grupo.